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NÃO HÁ NADA DE NOVO NO ASSÉDIO

  • Foto do escritor: Fala, Mana!
    Fala, Mana!
  • 3 de jun. de 2018
  • 3 min de leitura

Isadora Vieira e Pollyana Mesquita


Fonte: EISENSTAEDT, Alfred. V-J Day in Times Square. Times Square, Nova York, 14 de agosto de 1945

Em 1945, quando chegou ao fim a Segunda Guerra Mundial, uma foto se espalhou; um beijo aparentemente romântico, de um casal apaixonado, comemorando o fim da guerra. Essa foto tornou-se símbolo do fim de um período de conflito entre as maiores nações do mundo. E se muitos anos depois descobrissem que na verdade aquele beijo não teve nada de romântico, mas sim o retrato do assédio cometido por um marinheiro contra uma enfermeira? É isso leitores. Foi exatamente isso que aconteceu. O marinheiro George Mendonsa, em um ato intempestivo e abusivo, beijou à força Greta Zimmer Friedman. Ele estava alcoolizado. Ela não o conhecia. O beijo foi sem consentimento. A foto nada mais é do que a prova de um assédio/abuso sexual velado. Ela a segurou com força, como a própria Greta afirmou, em 2005, durante uma entrevista concedida à CBS:

“Não vi que ele estava chegando e, antes que eu tivesse percebido, já tinha sido agarrada Ele era muito forte. Mas eu não estava beijando ele. Ele que me beijou”.

Sabe qual foi a justificativa que ele deu, décadas depois, à CBS? Mendonsa disse:

“Estava muito feliz com o fim da guerra, tinha tomado uns drinques. Quando vi a enfermeira, agarrei e beijei. Foi aquele momento, sabe? Tinha acabado de voltar do pacífico e a guerra havia terminado.”

Mas não devemos nos assustar com essa história. Ela não é nova. Isso tudo é histórico. Na Idade Média prevalecia a ideia da superioridade masculina sobre a mulher. Ela pertencia ao homem por direito era reprimida pela igreja e pela sociedade, era vista como sexo frágil. Era esse o seu papel: uma mão de obra secundária, tendo como função obedecer ao marido e gerar filhos. E qualquer impulso que o homem tivesse e que o levasse a cometer atos inaceitáveis onde uma mulher estivesse envolvida, esta era a culpada. Elas eram culpadas pelos impulsos deles. Nas civilizações Gregas, a mulher era vista como uma criatura subumana, inferior ao homem. Era menosprezada moral e socialmente, e não tinha direito algum. Na Idade Moderna, mesmo com a queima de sutiãs, simbolizando a sonhada liberdade feminina, as mulheres vítimas de violência sexual eram incentivadas a cometer suicídio para salvar a honra da família, mesmo que elas tivessem sido abusadas por um familiar (pai, irmão, tio, etc.).


Setenta e dois anos depois da fotografia que ficou pra história, feita pelo alemão Alfred Eisenstaedt, a situação não mudou. As mulheres ainda sofrem assédio e violência. Beijos roubados, assobios, olhares e comentários, ainda são vistos pela sociedade como galanteios, charme, conquista. Esses exemplos nada mais são do que uma forma de exercer o poder e a virilidade do homem sobre o corpo da mulher. Mas aos poucos estamos mudando isso, mulheres (e alguns poucos homens) em todo o mundo, desde muito tempo, estão levantando discussões sobre a cultura do estupro.


As Gretas de todos os dias continuam seguindo suas vidas sendo reféns dessa cultura que as subjuga, que as vê como propriedade do macho. A Greta da foto morreu. Ela morreu aos 92 anos, no dia 08 de setembro de 2016. Ela morreu, mas antes contou ao mundo a verdade por trás da foto que era tratada como símbolo do amor. Não se cale, também. Ao ser assediada grite, chame atenção das pessoas para o que está acontecendo com você. Conte para alguém, busque ajuda, mas não se cale (curiouscat.me/falamana). Não há amor no assédio.

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